Secularismo admite várias concepções. Muitas fortemente dominadas por ideologia e até mesmo por crenças religiosas. Qual o entendimento mais adequado para um princípio constitucional? Como escreveu Charles Taylor, não deve ser exatamente a relação entre Estado e religião, mas uma resposta ao pluralismo de visões de mundo que respeite a liberdade de todos, a todos tratando com igualdade (Taylor, 2010:23). Significa, sucintamente, um tratamento público que, além de não interferir direta ou indiretamente com as opções de cada um, seja, ao mesmo tempo, igualitário aos crentes e aos descrentes. E crentes de todos os credos.
Para muita gente, o Estado deve agir com "neutralidade" em vista das escolhas e manifestações da consciência. Mas o que é ser neutro? O Estado é neutro quando permite que nas salas de audiências judiciais e nas escolas públicas sejam afixados crucifixos, imagens e sinais distintivos das diversas religiões? Ou se os proíbe completamente? Chamemos a primeira forma de neutralidade inclusiva; e a segunda, de neutralidade excludente. Há quem discorde da distinção. A Corte Europeia de Direitos Humanos, por exemplo. Neutralidade mesma seria apenas a inclusiva. A outra, excludente, seria secularismo.
A juíza Power, em Lautsi v. Italia, foi a mais enfática: “A neutralidade requer uma abordagem pluralista por parte do Estado, não uma visão secularista. A preferência pelo secularismo sobre visões de mundo alternativas - religiosas, filosóficas ou outras - não é uma opção neutra.” Neutralidade, secularidade ou laicidade estariam no distanciamento publico necessário a respeito dos sistemas de crenças. Secularismo ou laicismo, por outro lado, seria a desqualificação pública das religiões e crenças. Em sendo o Estado neutro, não havia problemas em se pendurarem crucifixos nas paredes das escolas públicas, portanto. Jogo de palavras.
Será que a ornamentação pública de símbolos religiosos não interfere na formação de identidades e consciências? Uma criança de cinco anos não sofreria influências religiosas se, em sua sala de aula, houvesse afixado a imagem de Jesus ou de Maria? Para a Corte Europeia, não: " Faltam provas de (...) que a exposição de um símbolo religioso (...) possa exercer alguma influência nos alunos.” É provável que exerça. Estaria a liberdade religiosa e o secularismo respeitados nesse caso? Não, pois haveria uma violação, ao menos, potencial à liberdade.
Se for pouco, imagino que a violação da igualdade seja mais pungente. O Estado não pode preferir uma crença a outra. Não pode pendurar um símbolo de uma religião em detrimento de outra. Isso tem nome: tomar partido. A menos que admitamos as paredes das escolas ou as salas de audiência como um cadeidoscópio de símbolos. Haveria de ser não religiosos também. Nem Andy Wahrol daria jeito. Uma barafunda. Seja pela igualdade, seja pela liberdade, prédios públicos, escola ou fórum, não podem ostentar símbolos religiosos. De qualquer espécie.
Leia mais em The Hedgehog Review, v. 12, n.3, Fall 2010
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