"Assim, a declaração de inconstitucionalidade, pelo Tribunal
de Contas da União (...) parece estar em confronto com normas constitucionais, mormente as que
traduzem o princípio da legalidade, as que delimitam as competências do TCU
(art. 71).
Não me impressiona o teor da Súmula n° 347 desta Corte,
segundo o qual "o Tribunal de Contas, o exercício de suas atribuições, pode
apreciar a constitucionalidade das leis e dos atos do Poder Público". A referida
regra sumular foi aprovada na Sessão Plenária de 13.12.1963, num contexto
constitucional totalmente diferente do atual. Até o advento da Emenda
Constitucional n° 16, de 1965, que introduziu em nosso sistema o controle
abstrato de normas, admitia-se como legítima a recusa, por parte de órgãos
não-jurisdicionais, à aplicação da lei considerada inconstitucional.
No entanto, é preciso levar em conta que o texto constitucional
de 1988 introduziu uma mudança radical no nosso sistema de controle de
constitucionalidade. Em escritos doutrinários, tenho enfatizado que a ampla
legitimação conferida ao controle abstrato, com a inevitável possibilidade de se
submeter qualquer questão constitucional ao Supremo Tribunal Federal, operou uma
mudança substancial no modelo de controle de constitucionalidade até então
vigente no Brasil. Parece quase intuitivo que, ao ampliar, de forma
significativa, o círculo de entes e órgãos legitimados a provocar o Supremo
Tribunal Federal, no processo de controle abstrato de normas, acabou o
constituinte por restringir, de maneira radical, a amplitude docontrole difuso
de constitucionalidade. A amplitude do direito de propositura faz com que até
mesmo pleitos tipicamente individuais sejam submetidos ao Supremo Tribunal
Federal mediante ação direta de inconstitucionalidade. Assim, o processo de
controle abstrato de normas cumpre entre nós uma dupla função: atua tanto como
instrumento de defesa da ordem objetiva, quanto como instrumento de defesa de
posições subjetivas."
Assim, a própria evolução do sistema de controle de
constitucionalidade no Brasil, verificada desde então, está a demonstrar a
necessidade de se reavaliar a subsistência da Súmula 347 em face da ordem
constitucional instaurada com a Constituição de 1988.
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